sábado, março 15, 2008

Que miséria...

Normalmente, quando falamos dos nossos voos, gostamos de contar os melhores momentos; de como apanhámos aquela térmica mesmo antes de irmos para o circuito, daquela dia espectacular de onda ou daquele por-do-sol fantástico no nosso primeiro voo solo.
Porém, por muito que nós gostemos de voar, nem todos os voos são perfeitos. Nuns as manobras saiem mal, noutras aterramos com muita força e ficamos sempre com aquele sentimento de não termos desfrutado ao máximo aquela oportunidade.

Certo dia, "lá estava eu" em Sintra, com a minha licença de piloto acabada de vir do INAC pronto para fazer os meus dois primeiros baptismos de voo.
No briefing da manhã, pedi para deixar passar a minha vez, para que quando chegassem as pessoas com quem ia voar pudesse ter prioridade. Não havia muita gente nesse dia para voar nos ASK-21, quer alunos, quer pilotos, portanto não deveria haver problema nenhum.
Lembro-me que durante toda a manhã e durante o início da tarde estavam nuvens a cerca de 400 metros "em" cima do palácio e um vento de Nordeste bastante forte que ia causar muitos problemas no regresso à pista a quem fosse para os lados da serra. Isto passou-se no final de Fevereiro.
Uma das vantagens de voar muitas vezes no mesmo sítio é que começamos a conhece-lo bastante bem e torna-se mais fácil lidar com a meteorologia.

Fiz os meus dois baptimos e depois fiz ainda um terceiro voo com uma das pessoas. Já depois de descolar para esse terceiro voo confirmei que as nuvens na serra estavam agora mais altas e o vento tinha rodado para norte, mas continuava forte.
Avaliei a situação e decidi que dava para "ir para a serra"
Larguei-me entre a vila e o palácio e verifiquei aquilo que já desconfiava. Havia ali uma corrente ascedente, provocada pelo vento de Norte, que dava para ficar por ali um bom bocado.
Terminei o meu baptismo e como o Jeans estava parado na beira da pista decidi pegar nele e ir experimentar a tal ascendente.

No espaço de tempo que decorreu entre os voos o vento alinhou-se mesmo com a encosta que estava a empurrar o vento para cima, mantendo-se a forte intensidade verificada ao início da tarde.

E pronto, lá estava eu de frente para o vento. Tinha algumas nuvens que se começavam a formar a minha frente e eram levadas pelo vento enquanto se formavam e eu aproveitava a ascendente e ia com elas até aquele que era o meu limite para conseguir voltar com vento de frente para a mesma posição.
Ali estava eu, pronto para fazer um fantástico voo de duas horas e dez minutos em Sintra.
Nem por isso...

Estar parado no mesmo sítio, não é propriamente o meu conceito de um voo divertido. Quando comecei a ficar com fome e com sede, também não foi engraçado. Passado um bocado, a bateria foi-se e fiquei sem rádio. Toda a gente sabia que eu estava ali parado e não tinha grandes intenções de me mexer.
Via o rebocador trazer planadores para verem o palácio e via-os a irem-se embora, enquanto eu lá estava... parado.
O fim da tarde começou a aproximar-se e começou a arrefecer MUITO!! Os meus pés estavam a congelar dentro das botas de voo e já tinha que me mexer para me manter quente. Para além disso uma grande vontade de deitar fora resíduos líquidos do corpo estava mesmo a pedir para me ir embora.
Fome, sede, solidão, frio e necessidades fisiológicas já só por si são más, quando se juntam são péssimas, mas precisava das horas e tinha que rentabilizar aquele voo ao máximo...


Fiquei lá até muito perto da hora do pôr-do sol e quando aterrei já estava tudo à minha espera para se ir embora.

No final do dia, fiquei com um voo de duas horas e dez minutos, o mais longo que tinha feito até então, mas fiquei também com o voo mais miserável da minha vida...

1 Comments:

Blogger Costa said...

Detesto monologares! A piada da coisa está em ter alguém com quem gozar o voo! Nem que seja para partilhar a fome, sede e vontade de regar as plantas! :) Bons Voos!

10:53 da tarde  

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